LARGO DO PELOURINHO, SALVADOR, BAHIA
O Irmão Paulo Lachenmayer nasceu em 1903, na pequena cidade de Langenargen, no
estado de Baden Württemberg, sudeste da
Alemanha, fronteira com a Suiça e a
Áustria.
Seu nome de batismo é Ernst Lachenmayer.
Seus pais, Mathilde Bachmor e Albert Lachenmayer,
constituíam uma família humilde, de formação católica. Aos 2 anos, o pai se
mudou com a família para Ravensburg, onde faleceu três anos depois, deixando esposa e quatro filhos.
Aos 15 anos, perdeu sua mãe, ficando, portanto, órfão de pai
e mãe. Seus irmãos, adolescentes, tomaram caminhos diferentes: as duas irmãs,
se recolheram em conventos beneditinos; Adolf, o mais velho, se mudou para
Munique e ele, Ernst, resolveu ser
escultor e por isso foi encaminhado para
uma oficina de arte sacra, estruturada em 3 degraus hierárquicos: aprendiz,
oficial e mestre.
Foi educado por Theodor
Schmell, importante escultor que o introduziu nos mistérios das artes sacras. Ernst começou
como aprendiz. Algum tempo depois, foi submetido a exame com uma banca da
Câmara de Artes e Ofícios de Ulm. Aprovado, passou a oficial.
Nesta época irrompeu
na Alemanha um movimento litúrgico que
arrastou centenas de jovens para a vida monástica. Ernst Lachenmayer foi um deles.
Vivendo próximo de Munique, Ernst consolidou
sua formação artística e, tendo conhecimento da carência de vocações sacerdotais no Brasil, emigrou para a Bahia, onde aportou
no dia 13 de agosto de 1922. Aqui permaneceu até morrer, sessenta e oito anos depois.
”A vinda de Irmão Paulo
para a Bahia, diz Paulo Veiga, pode ser inserida no fenômeno migratório
de monges alemães que vão se espalhar pelo Brasil com a missão de revitalizar
os institutos religiosos”.
Ernst, com, 19 anos, aqui chegou em companhia de três outros jovens:
Clemente Maria da Silva Nigra, José Lohr
Endres e Conrado Metzzer. “Três
daqueles quatro noviços alemães iriam prestar serviços relevantes para a
história e para as artes da Bahia. Dom Clemente
e Dom José Endres na história, e Irmão Paulo no campo das artes
(Ibidem).
Ao se ordenar, Ernst mudou o prenome, passando a chamar-se
Irmão Paulo Lachenmayer, OSB.
Irmão Paulo é considerado um dos precursores da arte moderna
na Bahia. Possuía grande ascendência sobre seus contemporâneos e amigos: Mário Cravo Júnior, Carlos Bastos e
Alberto Valença.
Não obstante ser religioso e rígido seguidor das normas monásticas, portou-se
como um artista de vanguarda. Conta Reynaldo Brito (apud Paulo Veiga), que “na
qualidade de escultor, o Irmão Paulo fez um grande Cristo completamente
diferente dos que estamos acostumados a ver. Fez também uma Santa Teresinha,
bem moderna e o então cardeal D. Augusto Álvares da Silva mandou retirar as
duas imagens porque não representavam o Cristo e a Santa”.
“O Irmão Paulos, disse Nelson Cardena, sofreu incompreensões
da arquidiocese que não aprovou algumas de suas esculturas com técnicas
inovadoras, mas que desafiavam os padrões estéticos sacros vigentes e também
dos baianos, durante a II Guerra Mundial, pela sua origem Alemã.”
Seu gosto artístico,
adaptado à rotina monástica, se manifestou de maneira magistral na arquitetura
sacra, na heráldica e nas artes gráficas.
De sua autoria são os projetos arquitetônicos de igrejas e altares, da capital e do interior baianos, tal como o da capela do Carmelo da Bahia, no
bairro de Brotas; consultorias para o
interior das grandes catedrais modernas do Brasil, como as do Rio de Janeiro, Brasília
e Nossa Senhora Aparecida (São Paulo); restauração de monumentos históricos de
Salvador, como as igrejas da Graça, Monserrat
e Abacial do Mosteiro de São Bento; reconstruções icnográficas, como a do próprio
Mosteiro onde viveu.
Foi uma das maiores autoridades heráldicas brasileiras, e a maior da Bahia. “Além de renovar o armorial
eclesiástico brasileiro com mais de duas centenas de iluminuras heráldicas, o
monge artista conseguiu abranger, na Bahia e no Brasil, as mais diversas áreas
daquela ciência medieval, incluindo brasões para famílias, municípios e
universidades” (Paulo Veiga). São de sua autoria, dentre outros, os brasões da Escola
Bahiana de Medicina e Saúde Pública, da Universidade Federal da Bahia e da Universidade Estadual de Feira de Santana. Disse
Luiz Gardel, (apud Veiga): “Os anos mais nefastos para a arte heráldica são
aqueles compreendidos entre 1900 e 1935. Esse período calamitoso termina
aproximadamente no fim de 1940, graças aos esforços de um heraldista de gênio,
o Irmão Paulo Lachenmayer OSB, conhecedor profundo de nossa ciência e artista
de gosto irrepreensível, O Irmão Paulo renovou e colocou em honra no Brasil a
heráldica eclesiástica. Por seus conselhos a vários prelados vindos consultá-lo
sobre os armoriais que desejavam tomar e compondo ele mesmo um grande número de
brasões, Irmão Paulo criou verdadeiramente um estilo de armorial e despertou o
interesse geral pelo brasão enquanto obra de arte”.
As imagens do livro “Relíquias da Terra de Ouro”,
comemorativo do bicentenário do Santuário do Bom Jesus do Matozinho, em Braga,
Portugal, são de sua autoria. De sua autoria são, também, as ilustrações da “Revista
do Serviço do Patrimônio Histórico e Artísitico Nacional (IPHAN).
Ao talento artístico de Irmão Paulo recorreram várias pessoas
físicas (intelectuais, políticos,
artistas, etc.), o poder público (governos municipais, estadual e federal) além
de empresas da capital e do interior.
Irmão Paulo é um pioneiro do desenho gráfico da Bahia, ao
lado de Manuel Querino, Arthur Arésio, Lênio Braga, Nelson Araújo e outros. De
sua autoria são dezenas de capas de livro, diversas ilustrações, ex-libris,
etc.
Ao Irmão Paulo devemos uma gravura que representa a cidade
do Salvador em seus primórdios, tal como foi murada ao tempo de Thomé de Souza.
A gravura, de valor inestimável, “mostra em primeiro plano a porta de acesso à
cidade, no local onde hoje é a Praça Castro Alves, cercada de água, com uma
depressão geológica natural que ainda existe e resultou numa ladeirinha que
desce rumo à Barroquinha. Destaca-se em
linha reta a primitiva Rua Chile, ao fundo o Paço Municipal e, na via paralela,
observa-se a Igreja da Ajuda. Em segundo plano a ilustração mostra a Ribeira
das Naus, hoje sede do II Distrito Naval”. Esta é única representação gráfica
que possuímos de nossa capital murada, tal como foi no período de 1549 a 1551”.
O Irmão Paulo faleceu em 1990, deixando um acerco de valor
inestimável.
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